terça-feira, 26 de novembro de 2024

 O PARNASIANISMO

GONÇALVES CRESPO





Soneto da Nudez

Há um misto de azul e trevas agitadas
Nesse felino olhar de lúbrica bacante.
Quando lhe cai aos pés a roupa flutuante,
Contemplo, mudo e absorto, as formas recatadas.

Nessa mulher esplende um poema deslumbrante
De volúpia e langor; em noites tresloucadas
Que suave não é nas rosas perfumadas
De seus lábios beber o aroma inebriante!

Fascina, quando a vejo à noite seminua,
Postas as mãos no seio, onde o desejo estua,
A boca descerrada, amortecido o olhar...

Fascina, mas sua alma é lodo, onde não pousa
Um raio dessa aurora, o amor, sublime cousa!
Raio de luz perdido em tormentoso mar!

Gonçalves Crespo







        António Cândido Gonçalves Crespo, de seu nome completo, nasceu no Rio de Janeiro 
em 11 de março de 1846 e faleceu em Lisboa em 11 de junho de 1883.
        É um lídimo representante da escola parnasiana da poesia portuguesa, porquanto teve que se natuaralizar para poder exercer a advocacia em Portugal.
        Atingiu a notoriedade como poeta, após a sua morte, quando se publicaram as suas Obras 
Completas, prefaciadas por Teixeira de Queirós e Maria Amália Vaz de Carvalho, escritora
 e poetisa que fora casado com o autor.

sábado, 16 de novembro de 2024

 BUSCA







Busca 

Corre o rio para o mar
Na pressa de o abraçar;
Corro eu no mesmo passo
Na procura dum abraço.

No leito de águas revoltas,
Nesse caminho entre margens, 
Sinto as amarras soltas
No seguir dessas viagens.

Leva o canto das sereias
O rio ao mar nos seus braços,
Surdo a essas melopeias
Fico preso nos sargaços.

O rio tem a certeza 
De chegar ao seu destino
Tão próprio da natureza;
Também busco com firmeza
A rota em que maquino
Alcançar a minha empresa.

Dure o tempo que durar
Sempre chega o rio ao mar;
Perdido nas minhas mágoas
Quero encontrar as águas,
Que me façam navegar
Até poder encontrar
O destino dum bom cais,
Para não perder jamais
Âncora de amarração,
Que me deixe fundear 
No cais do teu coração.

Juvenal Nunes





sábado, 9 de novembro de 2024

 POETAS DE PARABÉNS

INÊS LOURENÇO






Português Vulgar

O meu gato deixa-se ficar
em casa, farejando o prato
e o caixote das areias. Já não vai
de cauda erguida contestar o domínio
dos pedantes de raça, pelos
quintais que restam. O meu gato
é um português vulgar, um tigre
doméstico dos que sabem caçar ratos e
arreganhar dentes a ordens despóticas. Mas
desistiu de tudo, desde os comícios nocturnos
das traseiras até ao soberano desprezo
pela ração enlatada, pelo mercantilismo
veterinário ou pela subserviência dos cães
vizinhos. Já falei deste gato
noutro poema e da sua genealogia
marinheira, embarcada nas antigas
naus. Se o quiserem descobrir, leiam
esse poema, num livro certamente difícil
de encontrar. E quem procura hoje
livros de poemas? Eu ainda procuro,
nos olhos do meu gato, os
dias maiores de Abril.

Inês Lourenço





        Inês Lourenço é natural do Porto, onde nasceu em 7 de novembro de 1942.
        Dispersou a sua poesia por diversos jornais e revistas portuguesas, bem como por alguns 
países estrangeiros. Tem inúmeros livros publicados.
        Como poeta foi-lhe atribuída a medalha de mérito, pela Câmara Minicipal do Porto, em 9 
de julho de 2023.


sábado, 2 de novembro de 2024

 POEMAS POR TEMAS

AS FLORES




Tema: As Flores

A Duas Flores

São duas flores unidas,
São duas rosas nascidas
Talvez do mesmo arrebol,
Vivendo, no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol.

Unidas, bem como as penas
das duas asas pequenas
De um passarinho do céu...
Como um casal de rolinhas,
Como a tribo de andorinhas
Da tarde no frouxo véu.

Unidas, bem como os prantos,
Que em parelha descem tantos
Das profundezas do olhar...
Como o suspiro e o desgosto,
Como as covinhas do rosto,
Como as estrelas do mar.

Unidas... Ai quem pudera
Numa eterna primavera
Viver, qual vive esta flor.
Juntar as rosas da vida
Na rama verde e florida,
Na verde rama do amor

Castro Alves






        De seu nome completo António Frederico de Castro Alves nasceu em Vila Nova de Nossa 
Senhora do Rosário do Porto da Cachoeira, aos 14 de março de 1847. Viria a falecer em Salvador, 
a 6 de julho de 1871, aos 24 nos de idade, ainda na flor da vida.
        Rapidamente se impôs no mundo das letras, sendo considerado, pelos seus contemporâneos,
 o maior dentre os maiores.
        Improvisava com facilidade e era um excelente declamador.