VISIONAR
As palavras são a matéria-prima da arte poética.
O voo da imaginação transforma-as em palavras aladas.
domingo, 15 de setembro de 2024
domingo, 8 de setembro de 2024
POETAS DE PARABÉNS
PEDRO HOMEM DE MELO
Povo
Povo que lavas no rio,
Que vais às feiras e à tenda,
Que talhas com teu machado
As tábuas do meu caixão,
Pode haver quem te defenda,
Quem turve o teu ar sadio,
Quem compre o teu chão sagrado,
Mas a tua vida, não!
Meu cravo branco na orelha!
Minha camélia vermelha!
Meu verde manjericão!
Ó natureza vadia!
Vejo uma fotografia...
Mas a tua vida, não!
Fui ter à mesa redonda,
Bebendo em malga que esconda
O beijo, de mão em mão...
Água pura, fruto agreste,
Fora o vinho que me deste,
Mas a tua vida, não!
Procissões de praia e monte,
Areais, píncaros, passos
Atrás dos quais os meus vão!
Que é dos cântaros da fonte?
Guardo o jeito desses braços...
Mas a tua vida, não!
Aromas de urze e de lama!
Dormi com eles na cama...
Tive a mesma condição.
Bruxas e lobas, estrelas!
Tive o dom de conhecê-las...
Mas a tua vida, não!
Subi às frias montanhas,
Pelas veredas estranhas
Onde os meus olhos estão.
Rasguei certo corpo ao meio...
Vi certa curva em teu seio...
Mas a tua vida, não!
Só tu! Só tu és verdade!
Quando o remorso me invade
E me leva à confissão...
Povo! Povo! eu te pertenço.
Deste-me alturas de incenso,
Mas a tua vida, não!
Povo que lavas no rio,
Que vais às feiras e à tenda,
Que talhas com teu machado,
As tábuas do meu caixão,
Pode haver quem te defenda,
Quem turve o teu ar sadio,
Quem compre o teu chão sagrado,
Mas a tua vida, não!
Pedro Homem de Melo
Pedro Homem de Melo é o nome de um poeta e folclorista português nascido no Porto,
Acabou por se fixar no Minho região que muito o seduziu.
Embora a título póstumo foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique.
domingo, 1 de setembro de 2024
POEMAS POR TEMAS
SAUDADE
Minha Terra
Branca de sol e cal e de luar,
Minha terra que nunca viu o mar
Onde tenho o meu pão e a minha casa…
Minha terra de tardes sem uma asa,
Sem um bater de folha… a dormitar…
Meu anel de rubis a flamejar,
Minha terra mourisca a arder em brasa!
Minha terra onde meu irmão nasceu…
Aonde a mãe que eu tive e que morreu,
Foi moça e loira, amou e foi amada…
Truz… truz… truz… Eu não tenho onde me acoite,
Sou um pobre de longe, é quase noite…
Terra, quero dormir… dá-me pousada!
Florbela Espanca
qualidade dos seus sonetos.
O seu talento espraiou-se também, na prosa, como contista.
domingo, 25 de agosto de 2024
FEIRA DO LIVRO DO PORTO 2024
HOMENAGEM A EUGÉNIO DE ANDRADE
As Palavras
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparados, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
Eugénio de Andrade
domingo, 18 de agosto de 2024
O REALISMO-NATURALISMO
A dinâmica evolutiva da poesia fez que ao Ultrarromantismo sucedesse o Realismo-Naturalismo.O realismo retrata o dia a dia de pessoas comuns, de uma forma objetiva e utilizando uma linguagem direta.
Cesário Verde é um dos seus mais relevantes representantes.
De Tarde
Naquele «pic-nic» de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão-de-bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, inda o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão de ló molhado em malvasia.
Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas.
Cesário
Verde
Cesário Verde nasceu em Lisboa em 25 de fevereiro de 1855 e viria a falecer na mesma cidade,
em 19 de julho de1886.
A sua obra literária foi relevante no domínio da poesia, tendo alcançado notoriedade como expoente do Realismo.
domingo, 11 de agosto de 2024
POETAS DE PARABÉNS
A. M. PIRES CABRAL
Defeito de Fabrico
Quando nasci, trazia de origem
um farol que despejava luz a jorros
sobre o que quer que fosse,
mormente sobre as dobras
pérfidas da noite.
Mas, por estranho que pareça,
também os faróis estão sujeitos
às leis da erosão,
e o meu farol deliu-se. Hoje não é
mais do que um triste farolim de bicicleta
que apenas me alumia dois palmos de noite.
Amanhã estará reduzido
a uma simples lanterna de bolso
com que mal poderei reconhecer
o lugar onde estou.
Até que um dia será, está bom de ver,
o mais fiável cúmplice da noite –
– da noite que devia dissipar,
e não fundir-se nela.
Defeito de fabrico.
Mas a garantia caducou e o fabricante
nega-se a ressarcir-me do escuro.
A. M. Pires Cabral
António Manuel Pires Cabral, de seu nome completo, é um escritor português nascido
em Chacim (Macedo de Cavaleiros), em 13 de agosto de 1941. Exerceu a atividade profissional como professor,
revelando-se um talentoso homem de letras, enquanto romancista e poeta.
Com uma obra largamente premiada é considerado, depois de Camilo e Torga, o mais
influente escritor de Trás-os- Montes e Alto Douro.
Personalidade multifacetado realizou várias exposições como pintor aguarelista.
domingo, 4 de agosto de 2024
POEMAS POR TEMAS
VERÃO
Os Dias de Verão
Os dias de verão vastos como um reino
Cintilantes de areia e maré lisa
Os quartos apuram seu fresco de penumbra
Irmão do lírio e da concha é nosso corpo
Tempo é de repouso e festa
O instante é completo como um fruto
Irmão do universo é nosso corpo
O destino torna-se próximo e legível
Enquanto no terraço fitamos o alto enigma familiar dos astros
Que em sua imóvel mobilidade nos conduzem
Como se em tudo aflorasse eternidade
Justa é a forma do nosso corpo.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Sophia de Mello Breyner Andresen é uma poetisa natural do Porto, onde nasceu
em 5 de novembro de 1919.
Foi tradutora e o seu talento manifestou-se também na prosa, tendo escrito livros
de contos infantis.
Foi a primeira mulher portuguesa a receber, em 1999, o Prémio Camões.
Encontra-se sepultada no Panteão Nacional.
quinta-feira, 25 de julho de 2024
NOITE E DIA
A noite sucede ao dia,
No seu velado noturno,
Sem a luz que alumia
Tudo se torna soturno.
A noite lenta descerra
A escuridão no seu manto,
As trevas cobrem a terra
Num negror de desencanto.
Até na treva fechada
Nem sempre a treva domina,
Pois há uma luz pulsada
Com que o luar nos anima
A fender a noite escura,
No seu foco de brancura;
Num contraste é assim a vida,
Assumido sem detença,
Vivência às vezes contida,
Outras vezes mais intensa.
Por longa que seja a treva
Há de vir a madrugada,
Luz que na manhã se eleva
Para alentar a jornada
E ao repôr a esperança,
Farol a luzir de guia,
É com outra confiança
Que começa novo dia.
Juvenal Nunes
quinta-feira, 18 de julho de 2024
O ULTRARROMANTISMO
ÁLVARES DE AZEVEDO
Amor
Amemos! quero
de amor
Viver no teu coração!
Sofrer e amar essa dor
Que desmaia de paixão!
Na tu'alma, em teus encantos
E na tua palidez
E nos teus ardentes prantos
Suspirar de languidez!
Quero em teus lábios beber
Os teus amores do céu!
Quero em teu seio morrer
No enlevo do seio teu!
Quero viver d'esperança!
Quero tremer e sentir!
Na tua cheirosa trança
Quero sonhar e dormir!
Vem, anjo, minha donzela,
Minh'alma, meu coração...
Que noite! que noite bela!
Como é doce a viração!
E entre os suspiros do vento,
Da noite ao mole frescor,
Quero viver um momento,
Morrer contigo de amor!
Álvares de Azevedo
Nascido em S.Paulo, em 12 de setembro de 1831, faleceu no Rio de Janeiro em 25 de abril de 1852,
quinta-feira, 11 de julho de 2024
POETAS DE PARABÉNS
TOMÁS DE FIGUEIREDO
Sonetos
da Casa Amarela
Fumar, fumar! A tanto me
resumo
A fumar e a fumar o tempo arrasto.
Que longe o mundo está, o mundo vasto!
Fumar, fumar! O meu bordão é fumo.
Ir para o Norte ou Sul?
Perdi o rumo.
De tanto já sofrer me sinto gasto.
Dum fogo inapagável sou o pasto,
Sem que me mate, nele me consumo.
A tudo quanto sou eu digo
adeus.
Adeus à Fé, à Esperança! Ao próprio Deus?
Se houvesse um Deus consentiria nisto?!
Ou será
que o seu querer impenetrado,
para cumprir-se o nunca revelado,
me entregou maior cruz do que a de Cristo?
Tomáz de Figueiredo
Tomás Xavier de Azevedo Cardoso de Figueiredo é o nome completo de um escritor
quinta-feira, 4 de julho de 2024
PRÉMIO CAMÕES 2024
Adélia Prado
Casamento
Adélia Prado
Com esta publicação presta-se homenagem a Adélia Prado, considerada a maior poetisa
A atribuição do prémio à autora justifica-se pela originalidade da sua obra, que ao longo de
Nascida em Divinóplis, Minas Gerais, é licenciada em Filosofia.
domingo, 30 de junho de 2024
CONSIDERAÇÕES REFLEXIVAS
3ª Homenagem aos Santos Populares
Uma Quadra para um Santo
Dou hoje por concluída a receção de trabalhos para a iniciativa de homenagem aos santos populares.Confesso que esperava um pouco mais desta inciativa qundo fiz o seu lançamento e lancei a sua proposta.
Considerando todo o ambiente de festividade, de cariz vincadamnete popular, que envolve estas celebrações, parece-me que a adesão e participação, neste desafio, ficou aquém das espectativas.
Bastaria, por exemplo, estabelecer uma comparação com o ano anterior.
Mas deixemo-nos de lamentações. Importa agora agradecer a quem manifestou o seu apoio por esta homenagem e, mais do que isso, não receou corresponder-lhe participando com o esforço do trabalho apresentado.
Muito obrigado aos corajosos participantes.
Um abraço para todos.
Juvenal Nunes
PS: Os que quiserem poderão ostentar, em seus blogues, o signo distintivo da sua participação.
domingo, 23 de junho de 2024
terça-feira, 18 de junho de 2024
3ª HOMENAGEM AOS SANTOS POPULARES
O mês de junho é o mês dos santos populares.
Por tal motivo, quero convidar todos os amigos, leitores e autores, que visitam o
Palavras Aladas, para participarem nesta iniciativa.
Basta uma quadra para que a colaboração fique concretizada. Tão simples quanto isso.
-- postar o texto no seu blog, antecedido do distintivo pictográfico apresentado.
Saudações poéticas.
sexta-feira, 14 de junho de 2024
No Abraço, Sem Palavras - Dueto Amoroso - Poema 2
É assim que é o abraço: coração com coração, tudo isso cercado de braço.
(Mário Quintana)
No calor do teu abraço,sinto-me afagada na alma,como num ornado e belo laço,é bom calor, ele me acalma.
Nossas mãos nos aquecem,nem é preciso as palavras,só afagos, ternuras mágicas,merecemos, o mar sabe bem.
O mundo se tingiu de azul,céu e mar do Norte ao Sul,golfinhos celebram, bailamem sintonia, nos embalam.
Cinge a cintura com força,acarinha costas com bossa,entre carícias renovadas,chega-se às festas amadas.
Rosélia Bezerra
Imenso mar da paixão...Nas vagas bruscas do marSurgem ondas de desejoCrescendo num turbilhão,Em que busco navegarComo na água dum beijo.
A tormenta desesperaNesse constante vaivémQue não consigo evitar;Remo na minha galeraQue meu seguro provémPara poder aportar.
Vejo perto o futuroNo farol do horizonte;No meu barco sem arrais,Numa ânsia te procuro,A sonhar-te ali defronteÀ minha espera no cais:
E no correr desse passoEnvolvo-te num abraço.
Juvenal Nunes
Envio os meus parabéns à Rosélia por esta iniciativa e quero torná-los extensivos a todos os participantes aderentes.
terça-feira, 4 de junho de 2024
POEMAS POR TEMAS
NATUREZA
A fermosura
desta fresca serra
terça-feira, 28 de maio de 2024
O ULTRARROMANTISMO
BULHÃO PATO
Quando partiste ainda havia
Um sol como de verão.
Partiste, e logo a invernia
— Triste do meu coração —
Rompeu de cara sombria.
Mar que vias da janela,
Tão sereno e tão azul,
Torvo ao largo se encapela
Com as lufadas do sul,
Dando núncios da procela.
Uma avesita arribada,
Que à tarde poisou aqui,
Soltou um pio magoada;
Como eu as tenho de ti
Teve saudades, coitada!
Saudades… se breve espero
Ver-te, que estás a dois passos?
Sempre a um pai é desespero
Não ter a filha nos braços,
E eu como a filha te quero.
De passagem te direi
Que ontem, descendo o valado,
Com a casa defrontei,
E, vendo tudo fechado,
Por vergonha não chorei.
Quando do alto do casal
Me avistavam da janela,
Que alegria triunfal! …
Eras tu, e a Filomela,
E os lenços num vendaval!
— «Depressa, que o tio espera,
Jantar na mesa, são horas.»
E a tentar cara severa,
E rindo como as auroras
Dos dias da primavera!
Agora vêm da invernia
As cordas d’água puxadas
Na força da ventania,
E essas janelas cerradas,
E eu sem a vossa alegria!…
Já nem sei o que escrevi…
Vou fechar a carta. Adeus!
Guarda um beijo para ti,
Dá-me um abraço nos teus,
Y nó te olvides de mi!
Tornou-se conhecido no mundo das letras pela sua contribuição para a poesia ultrarromântica.
Frequentador de saraus literários, era um bon vivant, tendo-nos deixado a sua famosa receita de Ameijoas à Bulhão Pato.
sábado, 18 de maio de 2024
ENCONTRO
sábado, 11 de maio de 2024
POETAS DE PARABÉNS
MÁRIO BEIRÃO
Se cantas, nasce o dia;
A luz segreda à flor: Ave, Maria!
Tudo é silêncio, espanto,
Quando vaga no Azul o teu encanto...
Passas e deixas no ar
O perfume das rosas de toucar!
Creio em ti, como em Deus;
Viver à tua luz é estar nos Céus!
Verdes enleios de hera
Cingem de amor teu vulto, ó Primavera!
Nos perdidos caminhos,
Voam gorjeios, músicas dos ninhos...
A Terra em névoas de ouro
Ascende a Deus em teu olhar de choro!
Senhora da Harmonia,
Em ti a minha vida principia!
Se voas pela Altura,
Gravas no Azul a tua formosura!
Teu voo é um longo adeus:
O caminho das almas para os Céus...
Longe, saudosa, adejas,
E pairas sobre mim... bendita sejas!
Mário Beirão
Natural de Beja, onde nasceu em 1 de maio de 1890, Mário Beirão faleceu em Lisboa
Foi contemporâneo e colega de Américo Durão e Florbela Espanca.
A sua sensibilidade espelha o sentir da alma nostálgica. Hernâni Cidade considera-o,
sábado, 4 de maio de 2024
POEMAS POR TEMAS
DESEJO
No Obscuro Desejo
No obscuro desejo,
no incerto silêncio,
nos vagares repetidos,
na súbita canção
que nasce como a sombra
do dia agonizante,
quando empalidece
o exterior das coisas,
e quando não se sabe
se por dentro adormecem
ou vacilam, e quando
se prefere não chegar
e sabê-lo, a não ser,
pressentindo-as, ainda
um momento, na aresta
indizível do lusco-fusco.
Vasco Graça Moura
Vasco Graça Moura nasceu no Porto, a 3 de janeiro de 1942 e faleceu em Lisboa, a 27
Foi escritor, tradutor e político. Como escritor deixou assinalável obra poética.
Notabilizou-se, também, por ser um intransigente defensor da língua portuguesa.
Foi um dos autores da proposta para a realização da Exposição Mundial de 1998, em Lisboa.